8.11.07

Estapafurdices



Lá ia, pela floresta, de iPod no ouvido, Chapeuzinho Vermelho. Em sua mochila, rolos e rolos de notas frescas de dólar. Como sempre, caminhava rumo à casa da Vovó.

No meio do caminho, escondido atrás de um arbusto, à espreita, “Seu” Lobo, funcionário mal-caráter da LBV que adora acordar trabalhadores no sábado de manhã. Tarado por verdinhas, logo sentiu o cheiro do dinheiro que vinha chegando. Quando ouviu Chapeuzinho Vermelho se aproximar, limpou a garganta, ajeitou as orelhas e pulou, dando de cara com a netinha da vovó. Engatou a primeira e disse sem respirar:

- A-lôu, Senhorita Chapeuzinho, muito bom dia! Tudo bem com a senhorita? Espero que sim! Chapeuzinho, estou aqui hoje pra perguntar se a princesa poderá estar colaborando com nosso projeto social infantil para crianças. Me diga, Srta. Chapeuzinho, nossas criancinhas poderão estar contando com o leitinho que a Srta. ajudará a comprar?

Pálida, com os olhos injetados de sangue e ódio, Chapeuzinho responde:

- Chapeuzinho é o caralho, meu nome agora é Chapeleira!

Seguinte, ô Lobão, tô caminhando na paz até a casa da vovó. Todo dia aquela velha desgraçada me faz andar esse carai de floresta inteirinha pra levar o dinheiro do tráfico. Não sei por que a velha tinha que se esconder tão longe! Tô puta, cara! E você me vem com nhé nhé nhé? Sai andando que não tem merda de criancinha, nem porra de leitinho nenhum. Além do mais, a LBV é malandra, e eu detesto malandragem.


p.s: texto adaptado de um que escrevi durante um exercício de pensamento lateral, no curso de Redação Criativa ministrado pelo escritor e redator Henrique Szklo, da Academia de Criatividade. Curso excelente, recomendo a todos, inclusive a quem não é redator.


2.8.07

Deja vú


Eu não tenho lá muita sorte com empregadas. Sempre passo um baita nervoso com elas. Eu, que já não tenho muita paciência, sempre dou o azar de pegar as mais folgadas e comilonas.

A primeira, Dona Olinda, um catatau rechonchudo de pés bizarros, não me dava muito problema em relação a isso, mas na única vez, quase me mata de raiva. Na segunda-feira depois da Páscoa daquele ano, cheguei do trabalho e resolvi abrir o ovo que meus pais tinham me dado. Para minha surpresa, ele já estava aberto e quase no fim. Perguntei pro marido, que também é chegado numa besteira, e ele negou. Fiquei pasma! Em cerca de 6 horas (tempo que ela ficava na minha casa diariamente), ela lavou, aspirou, espanou e comeu 80% do meu ovo de Páscoa alpino (meu predileto) de 750 gramas.

No dia seguinte, quando perguntei, ela começou a chorar. Sim, que legal! Começou a chorar. Uma senhora de quase 60, na época. Fiquei puta, pois percebi que ela fez isso pra eu ficar com dó, já que assim que falei "tudo bem, deixa pra lá", as lágrimas sumiram imediatamente e ela já foi pra cozinha assobiando a mesma música de todo dia.

A próxima, Eliene, limpava muito bem. Bem mesmo. Todo dia eu encontrava a casa cheirosa e brilhante, e ela no quintal, deitada ao sol, com os cabelos cheios de creme, lendo a Caras que eu sempre recebia de graça. Isso mesmo. E não se fazia de rogada não! Já fez isso logo no primeiro dia. Como se isso não bastasse, comecei a perceber que a despensa e o freezer andavam esvaziando muito rápido. Passei a observar.

Ela chegava em casa por volta das 08 da manhã e já abria a geladeira. Tomava umas duas canecas de café com leite, comia todos (inclusive os que porventura eu tivesse comprado para mim) os pães que tivesse e, se fossem poucos, 2 ou 3, ela “arrematava’ com um belo miojo ou um bom prato de arroz, feijão e farofa ou macarrão, dependendo do que eu tivesse feito no jantar da noite anterior. E essa comida, que ela às vezes comia todinha (e não era pouca), era para eu e ela almoçarmos, já que eu trabalhava bem pertinho de casa. Quantas vezes não tive que eu comer um miojo porque o almoço tinha desaparecido...

E seu eu não tivesse feito jantar, ela escolhia qualquer coisa bem gostosa do freezer e preparava. Aquela bela picanha do churrasco do domingo, o peixe que eu pretendia preparar pro sogro no sábado, enfim, o que ela estivesse com vontade. Escolhia o menu e preparava. Claro, eu não gostei e fui falar. Sabe o que eu ouvia? - Ah, eu num posso ficá comeno sanduíche e miojo sempre que você não faiz janta.

Gente, eu não regulo comida. Alguns talvez pensem que ela era uma coitada, que talvez não tivesse comida em casa, que eu não tenho coração, etc e tal. Mas além de eu saber que não era essa a realidade, nada justifica ela comer tudo o que tem na minha casa e não deixar comida pra gente. Eliene realmente exagerava. Comia nossos iogurtes, chocolates, o último pedaço de bolo, qualquer coisa, como se não houvesse amanhã! Me tirava do sério diariamente.

Agora, tenho uma nova, a Elaine. Boazinha, coitada. Está comigo há 45 dias. Quando percebi que ela não comia nada, perguntei e ela respondeu que fazia dieta e preferia comer em casa, onde toma café da manhã e prepara salada e hamburgui (sic) frito (!!) quando chega. Tudo bem, pensei eu, ela chega às 09:00 e vai embora às 14:00, dá pra aguentar. Azar dela se não quer comer.

Só que, de repente, de uns 10 dias pra cá, acho que ela largou a dieta à base de saladas e frituras e passou para uma a base de chocolate e refrigerante. Do nada, passou a tomar quase um litro de leite com Toddy, comer bolachas de chocolate, cookies e abrir os refrigerantes da geladeira, tomando cerca de um litro por dia (de 5 horas) e, ainda por cima, deixando mal fechado, para não ter um milímetro de gás na hora que quisermos. Até aí, nada tããão grave assim. Relevei e só pedi para ela fechar direito o refrigerante e pronto. Só que quando foi hoje, na hora do almoço, fui seca atrás do macarrão com almôndegas que eu tinha preparado e que estava delicioso. Tinha sobrado bastante, não comemos muito no jantar de ontem. Cheguei lá e, surpresa! Tinha um pote na geladeira com uns 10 fios de espaguete e outro pote com um pouco de molho...sem nenhuma almôndega.

Eu já sei o fim dessa história.

27.7.07

Zica


Eu tenho uma calça preferida. Reta, preta, com vincos lindos. Ela é razoavelmente nova, comprei há 5 meses. Sabe aquela peça que você bate o olho e quer? Ainda tive a sorte de pegar uma liquidação, então paguei um preço bem bom por ela. Mas acontece que a calça veio com ebó*.


Na primeira vez que usei, fui fechar o botão e quebrei a unha quase na raiz. Fiquei puta, minha unha estava linda, mas ok.


Logo depois, perto do dia das mães, estava no shopping, toda esbaforida porque não achava o presente ideal, quando voei. É, voei. E caí de joelhos no chão. Resultado? Uma boa esfolada na calça (sem falar no joelho em si), além de uma vergonha sem fim, porque além de tudo, caí dentro do estacionamento VIP do shopping, onde imperavam madames e manobristas. Mas tudo bem, ainda dava pra usar a calça.


Daí, quando foi sexta-feira passada, eu podre, voltando do médico de táxi porque meu carro estava com dois (!) pneus furados, enfio o pé no cinto de segurança na hora de sair e...caio. De novo. Dessa vez, de quatro, numa calçada repleta de restos de verdura velha da feira de 2 dias antes (pensou no cheiro e na textura?) e, pior, exatamente na frente do Seu GPS, o vizinho velho e manco que eu ODEIO. Imagina a minha cara? Fora a dor, nos joelhos e na alma. A calça? Outra boa estragada, dessa vez na outra perna.


Então, hoje, estou eu explicando para a empregada que os vincos da calça não são para serem tirados na hora de passar, e sim refeitos, quando deixo cair o cigarro aceso no chão. Ela, muito solícita, abaixa para pegar e, num impulso, solta a calça. Claro, em cima do cigarro. Agora, além de tudo, a calça tem dois belos furos redondinhos, do tamanho da brasa do maldito cigarro. Pensam que eu desisti? Não! Afinal de contas, os furos ficaram bem perto da cintura, onde a blusa vai esconder, e eu amo a minha calça!

* ebó = macumba, trabalho, mandinga.

21.6.07

Das coisas guardadas aqui dentro

Desejo um dia frio com sol fraquinho

Desejo um abraço gostoso

Desejo ser uma pessoa melhor

Uma profissional melhor, uma amiga melhor.

Melhor.


Desejo um filho. Um não, dois.


Desejo que nosso amor se reacenda a cada dia.

Desejo estar sempre com você.


Desejo bolinhos de chuva feitos pela minha mãe.

Para acompanhar, um café feito pelo meu pai.


Desejo brincar mais com meu cãozinho.

Jogar bolinha até eu cansar. Afinal, ele não cansa.


Desejo sentar sem nada pra fazer.

Desejo tomar champagne sem motivo.

Desejo sentir aquele friozinho na barriga. De amor, não de medo.


Desejo respeito.

Desejo amor (mais) e valor.

Desejo ser desejada.


Desejo calma.

Desejo fogo.

Desejo água gelada e mãos quentes.



Corpo fechado.



Desejo ir para frente, sempre.

Desejo que você vá comigo.


Desejo estar em paz.

Comigo, com minhas lembranças, com minha vida, com tudo ao meu redor.


Desejo que a dor aprenda a desviar de mim.

Desejo ser menos ansiosa, mais intuitiva.

Desejo fluidez.


Desejo desejos simples, pequenos, na maior parte das vezes.

Mas hoje desejei tudo, e não consegui (quase) nada.

Então, desejo dias melhores.

Amanhã, logo cedo, em breve, urgente.